terça-feira, 28 de abril de 2015

Choque de gerações


As duas não se entendem e dificilmente se entenderão um dia. A vó diz que ela é malcriada, não obedece e é respondona. Ela retruca dizendo que a vó é chata, que só fala gritando e não a deixa em paz.

Avó na faixa dos 60 e ela com 6 anos. São o que se chama vulgarmente de choque de gerações. Brigam por tudo. Avó quer ver os programas policiais da TV e ela zapeia sem cerimônia a procura dos eternos desenhos mesmo que repetidos.

Avó quer que ela vá pro quarto para ver na tv de lá. Mas ela prefere a tv maior da sala. A casa tem dois quartos, mas elas dormem juntas no mesmo quarto, pois a menina tem medo de escuro de de fantasmas. Apesar do aumento da luz, dormem de luz acesa, pois se a menina acorda no meio da noite, no escuro, berra assustada e a avó que nem um foguete acende de um salto só a luz.

Ela reclama da comida. A avó diz que não é empregada e é o que tem. Ela exige batata frita e ovo. Discutem. Ela faz greve de fome. A avó frita o ovo e diz que a batata só no dia seguinte. Ela quer o ovo mole esparramando em cima do arroz.

Ela é criada pela avó. O pai deu no pé e a mãe trabalha fora na cidade e ainda faz faculdade. A avó é quem segura a barra.

Brigam de manhã até a hora de dormir. A avó ameaça devolvê-la para os pais. Ela diz simplesmente que isso é impossível pois o pai sumiu e a mãe não pode ficar com ela e a avó tem obrigação de cuidar bem dela.

Vai na geladeira e põe sorvete em uma caneca. A avó tenta tomar dizendo que sorvete só depois do almoço. Ela pergunta em que lugar isto está escrito. As duas polemizam.

A avó diz que não quer que ela fique doente, pois se isso ocorrer vai interná-la no hospital. Ela diz que é melhor, pois pelo menos lá será bem tratada.

Ela fica doente. A avó fica em sua cabeceira dando o remédio e tirando a temperatura e com um terço na mão rezando. Ela manda parar e pede para que a avó leia um livro. Reclama que a leitura não está sendo feita com a interpretação dos personagens como gosta, com vozes diferente para cada um.

Não aceita tomar um dos remédios. A avó insiste e diz que se não tomar irá morrer. Ela diz que não tem medo de morrer.
A avó deixa cair uma lágrima e diz que se ela morrer irá morrer também.

A menina então abre a boca e recebe a colher com o xarope e completa: "Salvei a sua vida!"

MAURICIO FIGUEIREDO

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